segunda-feira, 16 de maio de 2011

Leitura interessante - habeas corpus

Parte de artigo retirado de:

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O habeas corpus. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1257, 10 dez. 2006. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9248. Acesso em: 15 maio 2011.

(...) parte do artigo O habeas corpus
ALVES JR., Luís Carlos Martins. O habeas corpus. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1257, 10 dez. 2006. Disponível em: http://jus.uol.com.br/revista/texto/9248. Acesso em: 15 maio 2011.
O inciso LXVIII do artigo 5º da Constituição da República dispõe que "conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder". Nesse sentido, tem-se que o HC é a ação constitucional penal garantidora da liberdade de locomoção da pessoa humana constrangida em face de ilegalidade ou abuso de poder.
A origem do HC repousa no direito inglês e o significado de sua expressão é "tenha o corpo" ou "exiba o corpo" ou "apresente a pessoa". Nas três primeiras décadas do Século XX surgiu a denominada doutrina brasileira do HC, uma construção jurisprudencial do STF a partir de uma leitura ampliativa do disposto no §22 do artigo 72 da Constituição de 1891, cujo enunciado, em sua redação originária, prescrevia: "Dar-se-á o habeas-corpus sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência, ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder".
Em face desse enunciado, o STF, a partir da atuação advocatícia de Ruy Barbosa e da judicatura do Ministro Pedro Lessa, passou a conceder as ordens de HC não apenas nas hipóteses de liberdade de locomoção, mas diante de quaisquer afronta às liberdades do indivíduo. Essa doutrina foi predominante no Brasil entre os anos de 1909 a 1926. Nesse último ano, a Constituição de 1891 foi emendada e o aludido §22 do artigo 72 passou a ter a seguinte redação: "Dar-se-á o habeas-corpus sempre que alguém sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência por meio de prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade de locomoção". De lá para cá, o HC tem-se vocacionado à proteção da liberdade de locomoção. Os demais direitos anteriormente protegidos pelo HC, receberam um novo "remédio ou writ" judicial: o mandado de segurança.

3.
Natureza jurídica.
O HC tem natureza de ação popular penal constitucional, uma vez que provoca o Judiciário para solucionar um conflito entre a pessoa que tem sua liberdade de locomoção ameaçada ou violada e o agente ou órgão constrangedor dessa liberdade de locomoção. A situação configura um ilícito penal, daí o caráter penal em sua natureza. Nada obstante, o HC tem assento no texto constitucional. Eis o seu aspecto de remédio ou writ constitucional. Como pode ser ajuizado ou impetrado por qualquer um do povo, eis o matiz popular dessa ação.

4. Objeto.
O objeto do HC é o ato de agente ou órgão estatal ou que age com atribuição pública constrangedor da liberdade de locomoção do indivíduo. É o ato inviabilizador do direito de ir, vir e ficar sem constrangimentos ilícitos ou abusivos. É o direito de acesso, ingresso, saída, permanência e deslocamento dentro do território nacional (MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional, 2005, p. 112).

5. Finalidade.
A finalidade do HC é a proteção do direito constitucional de locomoção da pessoa humana em face de constrangimento ilegal ou abusivo, garantindo-se ao destinatário da aludida proteção uma situação de tranqüilidade e paz individual e de certeza de que não sofrerá coação ilegal ou ilegítima na sua liberdade de ir, vir e ficar.

6. Cabimento.
Nos termos dos artigos 647 e 648, incisos, do Código de Processo Penal – CPP (Decreto-Lei nº. 3.689, de 3.10.1941) cabe o HC sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar. A coação será considerada ilegal quando: a) não houver justa causa; b) alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei; c) quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo; d) houver cessado o motivo que autorizou a coação; e) não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza; f) o processo for manifestamente nulo e g) extinta a punibilidade.
O HC pode ser preventivo ou liberatório. No preventivo, o HC é impetrado se houver justo receio de que esteja ameaçada a liberdade de locomoção do indivíduo. No HC preventivo, pede-se um salvo-conduto para que a pessoa não tenha sua liberdade constrangida por uma ameaça ilegal ou abusiva. No liberatório, o HC é impetrado para sanar a violência ou coação cometida ilegal ou abusivamente contra a liberdade ambulatória da pessoa. Em ambas as espécies, nas hipóteses de perigo na demora (periculum in mora) e de "fumaça do bom direito" (fumus boni juris), ou seja, de que haja uma densa plausibilidade jurídica do pedido com o risco de sua ineficácia, se houver demora na prestação jurisdicional, o HC pode ser concedido liminarmente, inclusive sem a audiência prévia do agente ou órgão constrangedor da liberdade de locomoção.
O HC é o principal remédio processual de defesa da liberdade de locomoção do indivíduo. Sempre que esta estiver em risco ou violada, o HC pode ser manejado. Nos processos penais, se inexistente qualquer outro meio processual, pode-se lançar mão do HC. Nos cíveis, se houver risco de violação da liberdade ambulatorial do indivíduo, o HC pode ser usado. Indubitavelmente, o Habeas Corpus é a panacéia contra os males da perda de liberdade de locomoção.

7. Não Cabimento.
O HC não cabe se não houver ilegalidade ou abuso de poder na ameaça ou na privação da liberdade de locomoção do indivíduo. Nessa linha, um indivíduo regularmente preso, em princípio, não terá concedida a ordem de Habeas Corpus. Daí que a primeira análise acerca da eventual ameaça ou constrangimento da liberdade ambulatorial de um indivíduo diz respeito ao critério da legalidade ou abusividade dessa ameaça ou constrangimento. A "violência legal e válida" não será atacada via HC.
Não cabe o HC se houver a necessidade de dilação probatória. O HC pressupõe o direito líquido e certo à liberdade de locomoção com a demonstração documental de que há ilegal ou abusiva ameaça ou violação a esse direito. As provas devem estar pré-constituídas. Se houver a necessidade de comprovação das provas, de perícias, tomada de testemunhos etc., incabível o HC, haja vista o caráter sumaríssimo de seu rito procedimental, entendimento confirmado pelo STF no julgamento do HC 82.191 (Relator Ministro Maurício Corrêa).
Nos termos do §2º do art. 142 do texto constitucional, não cabe o habeas corpus em relação a punições disciplinas militares. O não cabimento do HC nessas hipóteses está condicionada ao mérito da decisão punitiva. Todavia, se houver ilegalidade na forma ou nos meios ou abusividade (desproporcionalidade ou irrazoabilidade) na aplicação da punição castrense, cabível será o remédio heróico contra as punições militares. Assim, nessas hipóteses, há de se perquirir se houve respeito à autoridade hierárquica, ao poder disciplinar em si, o ato disciplinar ligado à função e a punição disciplinar cabível, conforme precedente do STF no HC 70.648 (Relator Ministro Moreira Alves).

8. Legitimação ativa.
O HC pode ser impetrado (ajuizado) por qualquer pessoa, independentemente de capacidade postulatória processual. Ou seja, o autor da ação de Habeas Corpus não pressupõe a representação de um advogado, nos termos do artigo 654 do CPP e do §1º do artigo 1º da Lei 8.906, de 4.7.1994 – Estatuto da Advocacia. O primeiro dispositivo reza que "O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público". O segundo enuncia que "não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de habeas corpus em qualquer instância ou tribunal".
O destinatário da proteção do HC denomina-se paciente, que vem a ser aquele que se encontra ameaçado ou coagido ou violado em seu direito de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Impetrante é o provocador do Judiciário por meio do HC em seu próprio favor ou em favor de outrem. Nos termos do CPP, o Ministério Público também pode impetrar HC.
A proteção jurídica da liberdade ambulatorial impõe, inclusive, a possibilidade do HC de ofício, nos termos do §2º do art. 654 do CPP: "Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal".

9. Legitimação passiva.
O HC será impetrado contra o agente ou órgão com poder de decisão (liberdade de escolha) que ameaça ou coage ou viola ilegal ou abusivamente o direito de locomoção do paciente.
Nessa linha, o primeiro critério a ser analisado na hipótese de ameaça ou coação ou violência ilegal ou abusiva da liberdade de locomoção do indivíduo é se não se trata de buscar a proteção policial nas situações tipificadas na legislação penal, mormente os artigos 146, 147, 148 e 149 do Código Penal – CP (Decreto-Lei 2.848, de 7.12.1940).
Se a situação fática se enquadrar em algum dos referidos tipos penais, desnecessária será a impetração do HC, posto que o procedimento mais adequado seja a comunicação às autoridades policiais para que haja a cessação dessa ameaça ou coação ou violência à liberdade de locomoção do indivíduo.
Daí que pode ser legitimado passivo do HC tanto a autoridade pública quanto o agente privado, desde que haja poder de decisão autônoma em suas escolhas e que não sejam condutas tipificadas penalmente.

10. Procedimentos.
A petição de HC pode ser patrocinada por qualquer pessoa, inclusive pelo Ministério Público, em favor do signatário ou de outrem. Não há necessidade de advogado no patrocínio da ação. Não deveria. Em vista do valor protegido pelo HC, mais do que nunca a defesa técnica de um profissional da advocacia se faz indispensável.
O § 1º do art. 654 do CPP prescreve que a petição de HC conterá "a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça; b) a declaração da espécie de constrangimento ou, em caso de simples ameaça de coação, as razões em que se funda seu temor; c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não puder escrever, e a designação das respectivas residências". O § 2º do aludido artigo enuncia que "os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal".
Haja vista a possibilidade de qualquer pessoa impetrar o HC, independentemente de conhecimentos técnico-jurídicos e diante da possibilidade de sua concessão de ofício pelo órgão judicial, a jurisprudência tem sido o menos formalista possível no conhecimento e julgamento dessa ação. O conhecimento do HC pressupõe direito líquido e certo, não cabendo investigações ou dilações probatórias, devendo as provas documentais estar pré-constituídas e juntas aos autos.
Nada obstante, se o órgão julgador vislumbrar que a ameaça ou coação ou violência à liberdade de locomoção do indivíduo é ilegal ou abusiva, deve conceder de ofício a ordem de HC, independentemente dos pedidos feitos nos autos. A liberdade do indivíduo suplanta as formas processuais.
O art. 656 do CPP prescreve que "recebida a petição de habeas corpus, o juiz, se julgar necessário, e estiver preso o paciente, mandará que este lhe seja imediatamente apresentado em dia e hora que designar". No parágrafo único desse artigo está enunciado que "em caso de desobediência, será expedido mandado de prisão contra o detentor, que será processado na forma da lei, e o juiz providenciará para que o paciente seja tirado da prisão e apresentado em juízo". É da essência original do HC a apresentação do "corpo" do paciente ao magistrado, inclusive para verificar a integridade física do preso.
O art. 657 do CPP dispõe que "se o paciente estiver preso, nenhum motivo escusará sua apresentação, salvo I – grave enfermidade do paciente; II – não estar ele sob a guarda da pessoa a quem se atribui a detenção; III – se o comparecimento não tiver sido determinado pelo juiz ou pelo tribunal". No parágrafo único desse artigo está prescrito que "o juiz poderá ir ao local em que o paciente se encontrar, se este não puder ser apresentado por motivo de doença".
Ao juiz deve ser informado sob a ordem de qual autoridade esteja o paciente custodiado, nos termos do art. 658 do CPP.
Cessada a violência ou coação ilegal, o magistrado julgará prejudicado o HC, na linha do art. 659 do CPP.
O art. 660 do CPP prescreve que "efetuadas as diligências, e interrogado o paciente, o juiz decidirá, fundamentadamente, dentro de 24 (vinte e quatro) horas". Nos seis parágrafos desse artigo constam as seguintes disposições: "Se a decisão for favorável ao paciente, será logo posto em liberdade, salvo se por outro motivo dever ser mantido na prisão (§1º). Se os documentos que instruírem a petição evidenciarem a ilegalidade da coação, o juiz ou o tribunal ordenará que cesse imediatamente o constrangimento (§2º). Se a ilegalidade decorrer do fato de não ter sido o paciente admitido a prestar fiança, o juiz arbitrará o valor desta, que poderá ser prestada perante ele, remetendo, neste caso, à autoridade os respectivos autos, para serem anexados aos do inquérito policial ou aos do processo judicial (§3º). Se a ordem de HC for concedida para evitar ameaça de violência ou coação ilegal, dar-se-á ao paciente salvo-conduto assinado pelo juiz (§4º). Será incontinenti enviada cópia à autoridade que tiver ordenado a prisão ou tiver o paciente à sua disposição, a fim de juntar-se aos autos do processo (§5º). Quando o paciente estiver preso em lugar que não seja o da sede do juízo ou tribunal que conceder a ordem, o alvará de soltura será expedido pelo telégrafo, se houver, observadas as formalidades estabelecidas no art. 289, parágrafo único, in fine, ou por via postal (§6º).
Nos tribunais, a petição de HC será distribuída ao órgão competente, que requisitará, se entender necessário, informações por escrito da autoridade apontada como coatora. Se a petição não satisfizer os requisitos formais de seu conhecimento, será aberta a possibilidade de sua "emenda", sob pena de indeferimento, mediante a confirmação do órgão competente (arts. 661 a 663, CPP).
O HC tem rito privilegiado nos tribunais. Em regra, não há a necessidade de sua inclusão na pauta de julgamentos, nem de previa intimação. Recebidas as informações, ou dispensadas, o HC será julgado na primeira sessão, podendo, entretanto, adiar-se o julgamento para a sessão seguinte (art. 664, CPP).
Prescreve o parágrafo único do referido artigo: "A decisão será tomada por maioria de votos. Havendo empate, se o presidente não tiver tomado parte na votação, proferirá voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais favorável ao paciente". Esse dispositivo sufraga o princípio in dubio pro reo que é um dos alicerces das garantias penais dos indivíduos.

11. Competência julgadora.
No STF, a disciplina constitucional do HC está regulada nas alíneas b, c, d e i do inciso I do art. 102 e na alínea a do inciso II do mesmo artigo.
No STJ, a disciplina constitucional do HC está regulada nas alíneas a e c do inciso I do art. 105 e na alínea a do inciso II do mesmo artigo.
A competência constitucional dos TRFs e dos juízes federais está disciplinada nos arts. 108 e 109, sendo que no inciso VII deste último artigo está prescrito que os juízes federais julgarão o HC, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição.
As justiças trabalhista, eleitoral e militar processarão e julgarão o HC se o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição (art. 114, IV; art. 121; e art. 124, CF).
A justiça estadual terá sua competência definida pelas Constituições dos respectivos Estados e de suas leis de organização judiciária, observados os princípios estabelecidos na Constituição da República (art. 125, CF).

12. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF e do Superior Tribunal de Justiça - STJ.

No STJ inexiste súmula sobre o HC. No STF, as súmulas são as seguintes:
208: O assistente do Ministério Público não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de "habeas corpus".
299: O recurso ordinário e o extraordinário interpostos no mesmo processo de mandado de segurança, ou de "habeas corpus", serão julgados conjuntamente pelo tribunal pleno.
319: O prazo do recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal, em "habeas corpus" ou mandado de segurança, é de cinco dias.
344: Sentença de primeira instância concessiva de "habeas corpus", em caso de crime praticado em detrimento de bens, serviços ou interesses da união, está sujeita a recurso "ex officio".
395: Não se conhece de recurso de "habeas corpus" cujo objeto seja resolver sobre o ônus das custas, por não estar mais em causa a liberdade de locomoção.
431: É nulo o julgamento de recurso criminal, na segunda instância, sem prévia intimação, ou publicação da pauta, salvo em "habeas corpus".
606: Não cabe "habeas corpus" originário para o tribunal pleno de decisão de turma, ou do plenário, proferida em "habeas corpus" ou no respectivo recurso.
690: Compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de "habeas corpus" contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais.
691: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de "habeas corpus" impetrado contra decisão do relator que, em "habeas corpus" requerido a tribunal superior, indefere a liminar.
692: Não se conhece de "habeas corpus" contra omissão de relator de extradição, se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não constava dos autos, nem foi ele provocado a respeito.
693: Não cabe "habeas corpus" contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.
(...)

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